terça-feira, 28 de agosto de 2012

Obrigação de fazer e não fazer imposta a Luciano Huck

A notícia não é nova, mas é interessante:

Luciano Huck recebe multa por praia particular em Angra 
Justiça determinou a retirada das boias instaladas em frente à casa do apresentador em uma ilha da região. Huck vai recorrer. 

A juíza da 1ª Vara Federal de Angra dos Reis, Maria de Lourdes Coutinho Tavares, condenou Luciano Huck ao pagamento de R$ 40 mil por ter instalado um cerco de boias em frente à casa que possui na Ilha das Palmeiras, em Angra dos Reis, sem autorização ambiental em resposta a uma ação do Ministério Público Federal. 

O apresentador colocou as boias sob a alegação de que pretendia praticar a maricultura, mas a juíza concluiu que ele não tinha licença para esse tipo de atividade e que pretendia, de fato, afastar as pessoas que quisessem ir à praia. 

Caso não cumpra a ordem de retirar as boias, Huck ainda terá de pagar R$ 1 mil por dia. Em decisão publicada no último dia 22 de junho, o apresentador também foi condenado a outra multa de valor não especificado na sentença por ter descumprido uma decisão anterior em caráter de liminar que determinava a retirada das boias. Huck tem 15 dias para recorrer da decisão. 

Procurada pelo EGO, a assessoria do apresentador afirmou que ele vai recorrer da decisão. "Luciano Huck frequenta há mais de 10 anos Angra dos Reis e apoia projetos de desenvolvimento da região. Huck acredita que a maricultura é uma atividade que pode ser muito desenvolvida e tem um projeto tramitando no Ministério da Pesca e Aquicultura, Marinha e já aprovado pelo Ibama. Não concorda com a decisão e os advogados irão recorrer", diz nota enviada ao site. 

No processo, a defesa de Huck alegou que não tinha intenção de atrapalhar a navegação e aportou um documento da Capitania dos Portos que atestava que o acesso não estava impedido. Mas a juíza entendeu que, mesmo que não se pretenda dificultar o acesso, as boias constrangem e inibem o trânsito de banhistas. 

"Levando-se em consideração que o mar é bem de uso comum do povo, é vedado a todos os cidadãos impor restrições ao uso do mar para uso privado, o que se presume a partir da colocação de um cerco de bóias, sem utilização para atividade de maricultura (não importando que seja essa a intenção futura)", diz um trecho no processo.

A notícia é do Ego.

Bom, diante da situação posta, temos uma decisão judicial que condena o apresentador em duas obrigações: de fazer e de não fazer. A obrigação de fazer é a retirada das boias e a de não fazer é a proibição de colocar as referidas boias, que impedem o acesso das pessoas à praia.

Para quem tiver curiosidade de ver como as boias impedem o acesso à praia, podem conferir esse video aqui:
video retirado daqui

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Solidariedade Passiva e o art. 274 do CC

Para inaugurar o blog, trago excerto de Humberto Theodoro Júnior acerca do art. 274 do Código Civil. Diz o referido artigo: O julgamento contrário a um dos credores solidários não atinge os demais; o julgamento favorável aproveita-lhes, a menos que se funde em exceção pessoal ao credor que o obteve.

A confusão diz respeito à parte final do artigo, uma vez que se o julgamento foi favorável ao credor, como pode este fundar-se em exceção pessoal contra ele oposta pelo devedor? Ora, se o julgamento foi favorável, presume-se que a exceção (que é meio de defesa) oposta não foi acatada. Pois bem. Vamos ao que diz o autor:

Solidariedade ativa e coisa julgada 
Para o Código de Processo Civil a coisa julgada é a qualidade de que se reveste a sentença, quando não mais esteja sujeita a recurso, e que a torna "imutável e indiscutível" (CPC, art. 467). 

Essa intangibilidade da solução judicial dada ao litígio, não é absoluta, pois a lei impõe à autoridade da res iudicata limites objetivos e subjetivos. Objetivamente, a força da sentença trânsita em julgado manifesta-se "nos limites da lide e das questões decididas" (CPC, art. 468). No plano subjetivo, "a sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros" (CPC, art. 472).

Vale dizer: embora relacionada com o litígio sentenciado, não são abrangidas pela indiscutibilidade questões não enfrentadas pela sentença, desde que a sua posterior solução não importe modificar a situação jurídica assentada com autoridade de coisa julgada. Nem ficam privados do direito de discutir os reflexos da sentença em sua esfera jurídica, os terceiros que de nenhuma forma figuraram no processo em que se formou a res iudicata. 

Da existência de coisa julgada decorre para os sujeitos da relação processual finda, um impedimento processual a que se reabra disputa em juízo, no mesmo ou em outro processo, e entre as mesmas partes, sobre a lide e as questões já definitivamente julgadas. 

Essa sistemática processual sofreu interferência inovativa por parte do art. 274 do Código Civil de 2.002, onde se encontra regra heterotópica de indiscutível efeito sobre a disciplina do Código de Processo Civil traçada por seu art. 472 para os limites subjetivos da coisa julgada. 

Eis o preceito do dispositivo do novo Estatuto Civil: 
"Art. 274. O julgamento contrário a um dos credores solidários não atinge os demais; o julgamento favorável aproveita-lhes, a menos que se funde em exceção pessoal ao credor que o obteve". 
A norma permite, claramente, o desdobramento em duas situações bem distintas, a que correspondem soluções também diferentes, quais sejam: 
a) Um credor solidário aciona o devedor e perde a demanda (tem o pedido julgado improcedente), caso em que a coisa julgada fica subjetivamente restrita às partes do processo, tal como se prevê no art. 472 do CPC. Por conseguinte, outros credores não estarão inibidos de exercerem em novo processo a pretensão de exigir o cumprimento da mesma obrigação. A indiscutibilidade do julgamento anterior não os atinge, visto que não figuraram como partes no processo em que a sentença foi proferida e assumiu a autoridade de res iudicata[9]. 
b) Um credor solidário aciona o devedor e ganha a demanda (seu pedido é julgado procedente). Aqui surge a grande novidade heterotópica da norma do Código Civil: embora a sentença tenha sido dada em favor de um dos credores solidários apenas, os demais poderão dela se prevalecer. A eficácia da sentença, portanto, dar-se-á ultra partes e secundum eventum litis: se é desfavorável ao credor demandante, não prejudicará os demais co-credores; se é favorável, todos os credores solidários da mesma obrigação dela se beneficiarão.
Até aqui está tudo muito claro na compreensão do preceito com que o Código Civil alterou, em parte, a regra processual constante do art. 472 do Código de Processo Civil. A dificuldade surge diante da ressalva aposta no final do texto do novel art. 274 da lei material, in verbis: 
"O julgamento favorável aproveita-lhes, a menos que se funde em exceção pessoal ao credor que o obteve". 
 A propósito da solidariedade é bom registrar que, sem embargo de poder cada credor exigir por inteiro a obrigação, ou cada devedor se sujeitar ao cumprimento integral dela, não há necessariamente uniformidade da situação jurídica de todos os devedores ou de todos os credores. 

Nesse sentido, dispõe o art. 273 do Código Civil que o devedor acionado por um dos credores solidários, não pode opor "exceções pessoais oponíveis aos outros". Isto quer dizer que, diante da obrigação solidária, podem coexistir exceções comuns e exceções pessoais. Vale dizer: as defesas com que se resiste à pretensão podem variar, conforme seja o credor que promove a exigência do cumprimento da prestação. O que a lei civil não tolera é que o devedor demandado se defenda com exceções pessoais que digam respeito a outro ou outros credores. Cada credor sujeita-se, porém, a sofrer as exceções comuns a toda a obrigação solidária e mais as que pessoalmente se lhe apliquem na demanda individual. 

Se o devedor derrubar a pretensão de um dos credores com base em exceção pessoal, a improcedência da demanda em nada prejudicará a futura pretensão de outros credores, contra quem o devedor não terá a mesma exceção a opor. 

Aliás, se a exceção é acolhida, pouco importa saber se ela é comum ou particular, porque quando há insucesso da demanda do credor solidário, nunca se forma a coisa julgada ultra partes, segundo a primeira parte do art. 274. Sob o ponto de vista processual, a norma "dá suporte do fenômeno da coisa julgada secundum eventus litis e in utilibus, já que, pela própria previsão legal em análise, o resultado desfavorável a um dos credores solidários não atinge os demais"[10]. 

Assim, não se vê maior significado na ressalva que o legislador inseriu na segunda parte do art. 274, já que se alguma exceção tiver alguma influência no fracasso da demanda, nunca se formará a coisa julgada oponível aos co-credores que não figuram no processo. 

Ademais, em sua literalidade é de difícil interpretação o teor da Segunda parte do art. 274, quando correlaciona o julgamento favorável ao credor com decisório fundado "em exceção pessoal ao credor que o obteve". Se só ao demandado cabe excepcionar, como pode uma sentença contrária ao devedor fundar-se na exceção pessoal que ele mesmo invocou em vão? 

A impressão que prevalece diante desse dilema parece ser a de que a literalidade do dispositivo não traduz o que, de fato, esteve na intenção normativa do legislador. A ressalva final, para não ficar totalmente sem sentido, deve cingir-se ao impedimento de formar-se a coisa julgada contra os outros credores na parte em que a exceção pessoal foi rejeitada, "que, exatamente por isso, nada tem que ver com os outros"[11].

Merece acolhida, nessa ordem de idéias, a exegese proposta por FREDIE DIDIER JÚNIOR:
"Segundo nosso entendimento, o que se afirma no Código civil é que: a) se um dos credores vai a juízo e perde, qualquer que seja o motivo (acolhimento de exceção comum ou pessoal), essa decisão não tem eficácia em relação aos demais credores; b) se o credor vai a juízo e ganha, essa decisão beneficiará os demais credores". A ressalva da lei a essa extensão só pode se referir a outra "exceção pessoal que possa ser oposta a outro credor não participante do processo"[12]. 
Em suma: frente ao art. 274 do Código Civil, a sentença obtida por um credor solidário contra o devedor comum estende sua eficácia em benefício dos demais co-credores, formando a coisa julgada ultra partes. Esta eficácia exterior do julgado não impede ao devedor vencido o manejo de novas exceções pessoais que acaso disponha contra outro ou outros credores que não figuraram no primitivo processo, e que ulteriormente venham a cobrar a mesma obrigação. A respeito dessas exceções não se pode pensar em eficácia da coisa julgada, porque versam sobre questões que não figuraram no processo anterior, nem poderiam ter figurado, e por dizerem respeito a pessoas que tampouco participavam da relação processual em que a sentença foi proferida. São essas questões estranhas ao objeto da causa já decidida que, segundo a ressalva do art. 274 do Código Civil, não podem ser prejudicadas pela coisa julgada.

Disponível em: http://www.abdpc.org.br/artigos/artigo52.htm